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A responsabilidade civil nos crimes em transportes coletivos

(26.09.11)

Usuário dos serviços de trens suburbanos morre durante assalto.

Garoto de 11 anos morre vítima de bala perdida durante assalto a cobrador de ônibus.
 
Passageiro sofre atropelamento fatal após descer de veículo em movimento para fugir de assalto.
 
Estudante fica cego de um olho após lesão decorrente de objeto arremessado para dentro de coletivo.
 
Grávida fica paraplégica após levar tiro em ônibus.
 
Motorista que andava armado é assassinado ao reagir a assalto.
 
PM fardado leva tiro durante assalto e não pode mais trabalhar. 
 
De quem é a culpa? São muitas e variadas as questões sobre responsabilidade civil que chegam ao STJ. Entre elas, está a discussão sobre pretendida a culpa - por crimes ocorridos durante o trajeto - de empresas de transportes coletivos, cuja função é levar o passageiro, incólume, de um lugar para outro.
 
As empresas alegam que também são vítimas e se defendem, alegando, geralmente, caso fortuito ou força maior. Sete casos foram separados pela Coordenadoria de Editoria e Imprensa do STJ para discorrer sobre a responsabilidade civil nos crimes em transportes coletivos. Dos sete, dois são oriundos do RS. Nos julgados do STJ, duas empresas gaúchas tiveram sortes diferentes. A Central teve sua responsabilidade civil afastada; A Unesul foi condenada.

Assalto no trem
 
Em 1994, o hoje aposentado ministro Torreão Braz, relatou o REsp nº 50.129 no qual votou pela concessão de indenização por causa de morte durante assalto num vagão de trem da Companhia Brasileira de Trens Urbanos. O julgado afirmou que o caso fortuito ou a força maior caracterizam-se pela imprevisibilidade e inevitabilidade do evento. “No Brasil contemporâneo, o assalto à mão armada nos meios de transporte de cargas e passageiros deixou de revestir esse atributo, tal a habitualidade de sua ocorrência, não sendo lícito invocá-lo como causa de exclusão da responsabilidade do transportador”,afirmou o relator.
 
A decisão determinou indenização baseada na esperança de vida de acordo com a tabela do Ministério do Planejamento e Assistência Social. 

Bala perdida
 
No caso do garoto vitimado, a empresa foi condenada, inicialmente, a pagar à mãe indenização por danos morais e um salário e meio por mês até a data em que o filho completaria 25 anos. O TJ manteve a responsabilidade da empresa, mas retirou a obrigação do valor mensal, pois não teria se comprovado o dano material. Ao examinar o caso, em 1998, o STJ manteve a decisão, reconhecendo a responsabilidade da empresa na morte do menor. “Não vulnera a lei a decisão que impõe à empresa a prova da excludente da responsabilidade pela morte de um passageiro”, afirmou o relator, ministro Ruy Rosado de Aguiar, também agora já aposentado . 

Na ocasião, o relator transcreveu trecho do voto do desembargador Cláudio Vianna Lima, do TJ-RJ: "as concessionárias de transportes podem exigir do concedente tarifas mais adequadas e acobertar-se dos riscos mediante contratos de seguro, a exemplo do que acontece nos países desenvolvidos”. Ele sustentou que “o que não se concebe é que famílias inteiras, geralmente de parcos ou de nenhum recurso (o usuário de tais serviços pertence às classes mais humildes) fiquem desamparadas, relegadas à miséria, por decorrência de uma exegese fossilizada da lei que remonta ao começo do século”,completou. (REsp nº 175.794). 

Pulo para a morte

Durante assalto à mão armada em ônibus, passageiros pediram para que o motorista abrisse as portas. Um deles saltou com o veículo em movimento, foi atingido pelas rodas traseiras e morreu. Os pais entraram na Justiça. Condenada, a empresa alegou, em recurso especial, que a morte decorreu do assalto, causado por terceiro, o que é excludente de responsabilidade da empresa transportadora. 

Apesar de a 2ª Seção já ter firmado jurisprudência reconhecendo o argumento da empresa de que o assalto à mão armada dentro de coletivo constitui força maior a afastar a responsabilidade da transportadora pelo evento danoso daí decorrente para o passageiro, o ministro Aldir Passarinho Junior, relator do caso, deu apenas parcial provimento ao recurso especial. 

Segundo entendeu, houve precipitação do rapaz, até compreensível nas circunstâncias. “Mas houve um outro ingrediente, e este atribuído à empresa: é que o motorista do coletivo, imprudentemente, abriu as portas para que os passageiros saltassem”, ressaltou.  A decisão foi pelo caso fortuito em relação ao assalto, mas culpa concorrente, devendo ser abatido 50% do valor devido pela empresa. (REsp nº 294.610) 

Objeto no olho (caso do RS)
 
Um estudante do RS perdeu um olho, atingido por objeto atirado pela janela. A 3ª Turma do STJ aplicou a jurisprudência firmada. “A presunção de culpa da transportadora pode ser ilidida pela prova de ocorrência de fato de terceiro, comprovadas a atenção e cautela a que está obrigada no cumprimento do contrato de transporte”, afirmou o ministro Castro Filho (aposentado), em 2003. 

Afastada a responsabilidade civil da empresa Central S/A Transportes Rodoviários e Turismo (recorrente), foi negada a indenização para o recorrido. “O arremesso de objeto, de fora para dentro do veículo, não guarda conexidade com a atividade normal do transportador. Sendo ato de terceiro, não há responsabilidade do transportador pelo dano causado ao passageiro por causa de objeto atirado pela janela”, afirmou o julgado. (REsp nº 231.137) 

Grávida fica paraplégica

Uma grávida, atingida por um tiro durante tentativa de assalto ao ônibus em que estava, teve paraplegia permanente dos membros inferiores, impedindo-a totalmente de exercer atividade remunerada, necessitando de ajuda de terceiros até para os atos mais corriqueiros da vida cotidiana. Ela conseguiu indenização da empresa. 

A sentença reconheceu que a empresa possui o dever legal e contratual, como transportador, de conduzir o passageiro são e salvo a seu destino. A sentença foi mantida pelo TJ de São Paulo. A empresa recorreu, mas a 4ª Turma manteve a decisão de indenizar. “Por não ser mais ocorrência surpreendente, alcançando, inclusive, certo nível de previsibilidade em determinadas circunstâncias, as empresas que cuidam desse tipo de transporte deveriam melhor se precatar, a fim de oferecer maior garantia e incolumidade aos passageiros”, afirmou o ministro Cesar Asfor Rocha.
 
No julgamento, o ministro Ruy Rosado de Aguiar acrescentou: “a existência de dinheiro no caixa do cobrador é um atrativo, muitas vezes, para a prática do delito. Por isso, em outros países, já não se usa moeda para pagamento de transporte coletivo. Então, se a empresa não demonstrou que tomou as providências necessárias para evitar ou pelo menos diminuir o risco, que existe, penso que ela responde”. (REsp nº 232.649) 

Reação e Morte (caso do RS)

A família entrou na Justiça pedindo indenização pela morte do esposo e pai, um motorista de ônibus. Ele estava armado, e ao tentar evitar o roubo do cobrador e de passageiros, foi baleado pelos ladrões e acabou morrendo. O TJRS, por maioria, não responsabilizou a empresa Unesul de Transportes Ltda.
 
“Na ação de indenização, fundada em responsabilidade civil (CC, art. 159), promovida por vítima de acidente do trabalho ou por seus herdeiros, cumpre-lhes comprovar o dolo ou a culpa da empresa concessionária de transporte coletivo, expresso em ato positivo ou omissivo de seu preposto”, diz um trecho da decisão. 

O desembargador gaúcho Élvio Schuch Pinto, que ficou vencido, afirmou. “Se reagiu, foi, quem sabe, pensando em defender o patrimônio da própria empresa. Por que iria reagir? Imaginou que assaltados estariam não só os passageiros, como até o ônibus levariam, que é muito comum”, afirmou. 

No julgamento do recurso especial no STJ, o ministro Aldir Passarinho Junior concordou com a tese vencida no tribunal estadual, e fixou indenização para a viúva e filho, com pensão mensal e ressarcimento por dano moral de 50 mil para cada um. “Configurada situação em que a empresa, por omissão, permitiu que motorista seu andasse armado ao conduzir coletivo, bem como deixou de treiná-lo adequadamente para que não reagisse a assalto no ônibus, que terminou por lhe ceifar a vida, não se caracteriza, em tais circunstâncias, força maior a afastar a responsabilidade civil da empresa pela morte de seu empregado”, afirmou o relator. (REsp nº 437.328) 

Policial militar inválido

Ao examinar o recurso especial de PM que ficou inválido após levar tiro no pescoço durante assalto a ônibus, a 3ª Turma lembrou, inicialmente, que a empresa só responde pelos danos resultantes de fatos conexos com o serviço que presta, conforme jurisprudência fixada pela 2ª Seção. “A Turma deve decidir à base do que aconteceu: a parada irregular, contra a lei, que resultou na invalidez de um dos passageiros”, afirmou o relator Ari Pargendler.
 
A indenização foi determinada nos seguintes termos: “a pensão mensal é devida pela diferença entre o que o autor recebe do Estado como inativo e o que receberia no posto imediatamente superior ao de cabo, a partir do momento em que colegas seus, nas mesmas condições de tempo na carreira, teriam acesso a essa graduação”. A empresa foi condenada a pagar também R$ 30 mil reais por dano moral e R$ 30 mil por danos estéticos. (REsp nº 200.808).


Redação do Espaço Vital, com Coordenadoria de Editoria e Imprensa do STJ


Fonte: www.espacovital.com.br

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